quinta-feira, agosto 24, 2006

Mulheres que amam demais

Perante o post que escrevi sobre a Paridade, o Jorge fez o seguinte comentário/questão:

“Pensamento singelo:
Haverá muitos homens na tua situação?
Se sim, haverá muitas mulheres que ajam como o teu ex-amor?
Eu acho que as mulheres e os homens são completamente diferentes, felizmente!”

A tua questão não é nada simples e tem bastante conteúdo. Vou tentar explicar o que é amar demais. Peço desculpa aos psicólogos pela leviandade, mas irei apenas falar da minha experiência e de algumas ideias que fui lendo aqui e ali.

Respondendo à questão: "Haverá muitos homens na tua situação?" Julgo que haverão alguns, mas não é muito frequente. Existe um livro, de uma psicóloga americana, sobre a situação que eu estou a viver, que se chama "Mulheres que amam demais". O facto do título referir mulheres não surgiu por acaso.

Julgo que existem mais mulheres nestas situação porque uma das características das mulheres que amam demais é serem "cuidadoras". É "tomarem conta de..." alguém, e este papel é socialmente atribuído/ensinado às mulheres. Por outro lado, os homens que escolhem mulheres que amam demais são frequentemente pessoas carentes, que também possuem alguma questão do foro íntimo por resolver.

Se existe esta complementariedade de "salvador" e de "pessoa que precisa de ajuda", porque é que as coisas não correm bem?

Porque possuem formas de amar distintas. Porque ambos têm um problema íntimo por resolver. Nestas mulheres o problema leva-las a amarem demais. Nestes homens, o problema impede-os de se envolverem emocionalmente com as outras pessoas. Por exemplo, é frequente dizerem que nunca amaram, ou que não sabem exactamente o que é o amor. Eu ouvi isto algumas vezes da boca do meu ex-amor e não compreendia o que ele queria dizer. Achava que não era possível. Não compreendia…porque eu amo da forma oposta.

Por outro lado, apesar de existir uma "salvadora" e uma "pessoa que precisa de ajuda" não houve um pedido de ajuda.

Nós, as mulheres que amam demais, achamos sempre que os podemos ajudar. Achamos que podemos ser as suas "salvadoras". Achamos que os podemos mudar. No entanto, esquecemo-nos de que eles não pediram a nossa ajuda. No máximo pedem-nos que sejamos fortes e que os apoiemos. Não nos pedem que os ajudemos a mudar. Não nos pedem que esmiucemos a razão do seu problema. Não nos pedem para os levarmos a encarar a dor. Não nos pedem que a curemos. O meu ex-amor não me pediu que eu o ajudasse, mas foi isso que eu sempre assumi. Esqueci-me que, para resolver um problema interno, o próprio tem que o querer resolver.

Para além destas questões existe ainda um outro elemento importante: nós, mulheres que amamos demais, assumimos também o papel da "guerreira". Vivemos a ideia de que "Se eu lutar por ele, ele vai gostar de mim! Se eu sofrer por ele, ele vai me amar! Se eu lhe mostrar o quanto o amo, ele vai mudar!" Esta ideia e o facto destes homens não se envolverem emocionalmente, levam-nos a um ciclo repetitivo de amor – luta – rejeição – dor – amor – luta – rejeição - dor... No fundo, vivemos o conceito de que amor é dor.

Resultado: construímos uma dinâmica de complementaridade e afastamento ao mesmo tempo. Temos a mulher que procura ajudar o homem a quem ama demais e temos o homem que não quer os seus cuidados e rejeita envolver-se.

Segundo os psicólogos, existem casais que vivem esta dinâmica uma vida inteira. No entanto, se algum dia, algum deles resolve os seus problemas emocionais, o mais provável é que se separarem. Para um deles, esta dinâmica torna-se insuportável. Para um deles, já não existe razão para este cirandar, para esta "dança" de patologias. : )

Voltando às questões do Jorge, se respondi que existem alguns homens que amam demais, também devem existir algumas mulheres que não se envolvem emocionalmente. No fundo, são papéis e patologias complementares e dependentes uma da outra.

Sobre as diferenças entre homens e mulheres. Concordo que podemos ter formas completamente diferentes de amar. Concordo que, na maioria das situações somos muito diferentes, mas julgo que esta diferença apenas ocorre porque somos social e culturalmente "moldados" para papéis diferentes. Não me parece que existam aqui outros factores. Sou da opinião de que, o facto desta patologia [não sei se este será o termo correcto] ser mais frequente entre as mulheres, se deve em grande medida à forma como cada um dos géneros é socializado e aos papéis atribuídos a cada um deles. No fundo, vejo aqui a (tradicional) mulher “sensível” em oposição ao (tradicional) homem “que não mostra os seus sentimentos”.


PS: Esta “patologia” tem outros elementos/nuances importantes e interessantes, de que depois vos falarei aos poucos e poucos.
PS2:Os psicólogos que me perdoem alguma incorrecção.

1 comentário:

Anónimo disse...

este posting fez-me pensar sobre o que significa "amar de mais". escrevi um posting sobre isso no meu blog se quiseres passa por la.

Nao sei se concordo contigo totalmente q a difereca homem/mulher tem so a ver com o facto de estarmos socialmente programados para nos comportarmos de determinada maneira. Acho que tambem tem a ver com o facto de as mulheres terem mais problemas de estima e aceitacao delas proprias que os homens. As coisas estao bastante diferente, claro mas de qqr maneira continuamos a tentarmo-nos enquadrar num modelo de soiedade que cada vez exige mais da mulher. Hoje em dia a mulher, e mae/dona de casa/profissional/professora/organizadora/ gestora/etc, para alem de que temos que estar sempre em cima da moda, falar dos ultimos temas de politica internacional e saber ql foi o ultimo livro de historias infantis que saio ontem no mercado. Cada vez nos sobrecarregamos com mais coisas. E e essa inabilidade de "estar em cima de tudo" que por vezes nos faz sentir derrotadas e desapontadas. As espectativas de um homem para com ele mesmo sao diferentes, querem ser bem sucedidos nas suas carreiras, serem pais de familia (a.k.a. trazer para casa o "pao") e querem uma mulher "shampoo & condicionador num so". Sao menos coisas com que se preocupar logo maior e o grau de satisfacao.
Nao e a sociedade que atribui as funcoes a mulher. Somos nos que decidimos nos sobrecarregar pq nao queremos ser rotuladas pela sociedade de "mas maes" "mas esposas" "Corporate Bitches" etc. A realidade eh, nao podemos agradar gregos e troianos. As mulheres tem que se libertar da mentalidade "e o que e que os outros vao pensar/dizer, etc". O femeninismo nao vei promover somente a egualdade economica, nao! Veio libertar a mulher das cargas impostas pela sociedade. Somos livres socialmente falando. as continuamos a viver prisioneiras do nosso Ego e da constante necessidade de aprovacao externa.